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8 de maio de 2024
quarta-feira, 8 de maio de 2024
Raphael Câmara
Raphael Câmara
Raphael Americano Câmara é desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Formou-se em direito em 1999, tem mestrado, doutorado e pós-doutorado pela Universidade Federal do Espírito Santo em História Social das Relações Políticas, especializações em Direito Público e Direito Processual Civil.

A questão da Paciência

Cuidávamos da fé, não exatamente como um fenômeno religioso, mas tratada como virtude humana e temporal que nos impele ao despego de controlar o mundo. A decisão refletida em soltar o barco, içar as velas e aguentar firme enquanto as ondas ameaçam adernar nossa vida. E, sem vitimismo, continuar praticando gestos de caridade apesar da escuridão do horizonte, aumentando a cortesia, sendo vigilante com a delicadeza no trato e sorrir. Enfim, sorrir quando a dor te torturar.

Porque o convite da vida não é para atravessar desertos. Isso seria fácil demais. Fosse só isso, o tempo cuidaria de tudo, como de fato cuida, tal qual um senhor zeloso e infalível. O convite da vida, meu amigo, é atravessar o deserto, mas com sabedoria, escolhendo o caminho mais seguro e guardando as poucas energias para as lutas que, de fato, precisam ser enfrentadas.

Diante da tempestade de areia que parece te engolir, manter-se ereto e seguir pelo caminho seguro escolhido, pé ante pé. Centímetro por centímetro. Embora pudesse fugir, encontrar abrigo no fosso imundo da covardia, você simplesmente segue, e o faz pacientemente. Embora pudesse sentar-se; embora pudesse morrer; embora pudesse matar alguém para fazer do corpo uma trincheira, você simplesmente segue firme, sem esperar validações.

Embora pudesse tudo e tanto! Você simplesmente segue com paciência, abdicando de tudo e de tanto para percorrer o caminho que escolheu. Essa é a paciência eficaz. Não uma virtude fraca daqueles que nada podem e, portanto, só resta esperar. Diante da morte a paciência não ajuda, porque o que sofre não pode mudar mais nada. Precisará ser forte, constante, magnânimo e corajoso. Mas a paciência ajudará pouco. Já não existem opções.

A paciência é o isolamento momentâneo do potente.

Daquele que, estimulado pelo desgosto e embora possa vencê-lo ou vingar-se violentamente, prefere recolher-se e refletir. Aí está a virtude: é lícito, mas não convém. É que não são os infortúnios que nos abatem, mas os julgamentos apressados que fazemos dele. A reação sem reflexão. A retorsão imediata. A impaciência nos leva às ações violentas que nos enredam em um cenário cinza e barulhento. Bastaria um tempo de recolhimento e tudo faria o sentido verdadeiro.

É preciso ter cuidado para que as consequências da agressão não sejam piores que as causas da agressão.

É preciso ser paciente. Já adianto que isso dói. Esfola a pele. Escrever sobre a paciência é doloroso. Solitariamente doloroso. Ler eu já não sei. Diga-me você. Quanta dor você está disposta a suportar?

Até breve!

Raphael Câmara
Raphael Câmara
Raphael Americano Câmara é desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. Formou-se em direito em 1999, tem mestrado, doutorado e pós-doutorado pela Universidade Federal do Espírito Santo em História Social das Relações Políticas, especializações em Direito Público e Direito Processual Civil.

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