O futebol e o carnaval são as duas principais âncoras do softpower brasileiro. Em contraposição ao hardpower, que é o poder militar, de coerção, trata-se da capacidade de influenciar, de agregar valor a um país e a seus produtos pela via da admiração e da qualidade cultural intangível.
O ambiente de negócios, o fluxo de turismo, o investimento direto estrangeiro, o preço dos ativos, enfim, a marca Brasil se valoriza como consequência do softpower brasileiro.
Brasileiros em viagem ao exterior ouvem Tom Jobim nos restaurantes e shoppings e conversam sobre o futebol brasileiro e seus craques com jovens, motoristas de táxi e garçons. Todos ficam orgulhosos!
O antropólogo Roberto da Matta formula que a força do futebol e do carnaval brasileiros deriva da atitude de transgressão do povo discriminado e excluído, que aproveita as brechas culturais para a sua afirmação, enfrentando a estrutura formal e normativa da sociedade brasileira, formada no escravismo, nos privilégios e no “sabe com quem está falando”.
O futebol capixaba, apesar da tradição de revelar grandes atletas, ainda não conseguiu se inserir no mundo dos clubes e campeonatos atrativos e viáveis financeiramente.
Já no mundo do carnaval, das escolas de samba e dos seus desfiles conseguimos nos colocar no mapa e temos tudo para que o samba capixaba e nosso desfile sejam uma forte alavanca para que Vitória se torne um destino turístico internacional.
É preciso separar o financiamento das escolas de samba do financiamento do desfile. As escolas são pontos de cultura e economia criativa nas comunidades e desenvolvem atividades que formam a base para o desfile, mas não apenas para o desfile.
As escolas de samba precisam de apoio financeiro não reembolsável do setor público para suas atividades anuais. As escolas precisam de sedes próprias, quadras, para desenvolver sua programação regular e gerar receitas.
O desfile é um espetáculo altamente rentável. Gera receitas e negócios que pagam com folga o custo do evento e poderiam também pagar cachês muito bons para as escolas que são, afinal, as estrelas da festa.
Na prática, as escolas ainda se desdobram em esforço de captação de doações e patrocínios diversos para conseguir colocar a escola no Sambão do Povo, em meio a muita insegurança e incerteza.
No futebol, a legislação do modelo “clube empresa” ou SAF está se generalizando no Brasil e permitindo que os clubes brasileiros possam participar em condições mais competitivas do calendário internacional, ao mesmo tempo em que as competições nacionais ficam mais atrativas.
Ídolos e celebridades do mundo dos esportes e das artes são ativos valiosos, e os negócios de seus eventos movimentam bilhões. Demorou muito, mas acho que, no futebol, começamos a andar no rumo de um modelo de negócio e regulação de mercado mais contemporâneo.
Na sociedade do espetáculo não existe nenhum business como o show business, já diziam os norte-americanos, mestres do softpower de Hollywood. Vejam o filme, comprem o livro, os bonecos, as camisetas, visitem o parque temático e vibrem com nossos heróis.
No samba, nossos heróis ainda estão chegando na galeria principal. É emocionante ver a programação do show de aniversário de 65 anos de Zeca Pagodinho e o respeito e a admiração de todo o Brasil por este ex-apontador de jogo do bicho tornado celebridade.
Neste carnaval de Vitória de 2024, vamos cantar e brincar e também rezar pela vida de Edson Papo Furado, nosso sambista mais carismático e talentoso. Ele se aposentou como funcionário da PMV, operário da Secretaria de Obras.
Quando o projeto dos CAJUNS (Caminhando Juntos) começou, ele foi nomeado coordenador de samba, para dar aulas de música para os jovens das comunidades. Organizou vários grupos de samba e compartilhou sua enorme cultura musical com a garotada.
Deus permita que este mestre continue com a gente!