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9 de maio de 2024
quinta-feira, 9 de maio de 2024
Fernando Carreiro
Fernando Carreiro
Há 18 anos, Fernando Carreiro vive no meio do poder e dos poderosos. Jornalista, é consultor de comunicação especializado em crises de imagem, estratégia política e comportamento humano.

A terceira via na lanterna

Em 2014, Marina Silva, então candidata a presidente da República, quase furou a polarização estabelecida entre Dilma e Aécio Neves. Quase, não fosse o golpe de marketing da campanha da petista, afinal, para a presidente que se candidatava à reeleição era mais admissível ter como adversário um velho conhecido, o PSDB, a provar o dissabor da desconhecida figura de uma acriana com discurso politicamente correto, ora em ascensão.

A terceira via na lanterna

A ideia de ter velhos inimigos como algozes, em substituição àqueles cujo comportamento e poder de sedução, estando no poder, não se pode prever, é uma escolha inteligente de quem ocupa os polos. Uma quebra de ciclo pode ser uma grande decepção para o eleitor, tanto quanto pode ser um convite a nunca mais repetir o passado. Quem pode prever? Na dúvida, faz-se “o diabo” para manter por perto inimigo de sempre, com o qual se sabe lidar.

Vila Velha, por exemplo, tem um histórico de não reeleger prefeitos. Mas, como são as andorinhas, os eleitores canelas-verdes parecem saber o caminho de volta. Por muito tempo, os polos se estabeleceram entre as figuras de Neucimar Fraga e Max Filho, até que Rodney Miranda furou a bolha, e decepcionou. Vila Velha voltou para os braços de Max na eleição seguinte. Então veio Arnaldinho Borgo, que parou, mais uma vez, a antiga gangorra, que meneava em looping de um lado a outro. Pela primeira vez em algum tempo, quase vinte anos, a segunda maior cidade do Espírito Santo caminha para escolher o mesmo produto, ao mesmo tempo em que Max e Neucimar são percebidos como mercadorias com prazo de validade vencidos nas prateleiras.

A Serra se reveza há 28 anos entre Audifax e Sérgio Vidigal. E eles sabem que essa dualidade os mantém vivos na memória e nas escolhas do eleitorado. A ameaça da ascensão de um novo nome ao comando da cidade é um risco para a hegemonia compartilhada entre os dois há quase três décadas. E eles sabem disso. Pablo Muribeca, que corre por fora, também.

Salvo raras exceções, sobretudo em cidades do interior, as eleições municipais deste ano serão tomadas pela polarização. Em muitos pleitos, veremos a verticalização da disputa, com a guerra ideológica e de costumes que mantêm de pé o bolsonarismo e o petismo. A possibilidade do surgimento de uma terceira via é um fantasma conhecido que o PT deseja manter preso nos porões da política. Tal qual os ratos de Pavlov e seus estímulos behavioristas, petistas e bolsonaristas conseguem sentir na pele a dor de perder seus reinados, antes mesmo dos estímulos elétricos iminentes.

São Paulo, que costuma ser um termômetro para o resto do Brasil, embora não seja seu reflexo translúcido, deu mostras do que vem por aí: a polarização calcificada que estabelece o ódio como premissa para o instituto do voto. Escorado na popularidade de Bolsonaro, o prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes, encostou em Guilherme Boulos, que tem o apoio de Lula, na pesquisa Datafolha divulgada na última segunda-feira, 11: 30% e 29%, empate técnico. Nunes chama Boulos de invasor de terras, enquanto este acusa aquele de corrupto, sem papas na língua, e para dizer o mínimo. Tabata Amaral, com seu posicionamento calcado na terceira via, está 21 pontos percentuais atrás do segundo colocado.

Há espaço para uma alternativa? Sempre há. Mas no mundo de hoje, ela não deve vir encapsulada em um discurso de paz, amor e propostas. O eleitor quer novas creches, vagas nas unidades municipais de educação, atendimento de excelência na rede pública de saúde e o aumento do efetivo das guardas municipais, mas quer, na mesma medida, conexão com um candidato disposto a partir para o enfrentamento e defender suas ideias – não as dele, candidato, e sim as do eleitor.

Já escrevi aqui, algumas vezes, que um discurso bonito, só, não vence uma eleição. O que toca o coração do eleitor é o balbuciar de seus sonhos mais íntimos. Quando um candidato fala uma linguagem que ele entende, compreende e absorve, capturar a atenção é a primeira consequência; movê-lo até a urna, a segunda.

Fernando Carreiro
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Há 18 anos, Fernando Carreiro vive no meio do poder e dos poderosos. Jornalista, é consultor de comunicação especializado em crises de imagem, estratégia política e comportamento humano.

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