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3 de maio de 2024
sexta-feira, 3 de maio de 2024
Bruno Gomes Borges da Fonseca
Bruno Gomes Borges da Fonseca
Pós-doutorado em Direito pela PUC-Minas; Pós-doutorado em Direito pela UFES; Doutor e Mestre em Direito pela FDV; Procurador do Trabalho na 17ª Região; Professor da FDV; Professor do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Pública da UFES; ex-Procurador do Estado do Espírito Santo

Projeto de Lei sobre o trabalho em empresas operadoras de aplicativos – Parte 6

Nesta série, estou analisando o Projeto de Lei Complementar (PL) n. 12/2024, atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados, apresentado pelo Governo Federal cujo objeto é a relação de trabalho entre trabalhadores e empresas operadoras de aplicativos de transporte remunerado privado individual de passageiros em veículos automotores de quatro rodas. Neste artigo, abordarei os princípios aplicáveis ao trabalho realizado em favor dessas empresas.

Segundo o texto do art. 7º do PL n. 12/2024: “[…] Os serviços das empresas operadoras de aplicativos e o trabalho intermediado por suas plataformas devem pautar-se pelos princípios de: I – transparência; II – redução dos riscos inerentes ao trabalho; III – eliminação de todas as formas de discriminação, violência e assédio no trabalho; IV – direito à organização sindical, à sindicalização e à negociação coletiva; V – abolição do trabalho infantil; e VI – eliminação do trabalho análogo ao de escravo”.

O princípio da transparência, detalhado pelo art. 8º do PL n. 12/2024, exige que  as empresas permitam que o trabalhador tenha acesso às informações em linguagem clara e de simples entendimento sobre os critérios de oferta de viagens, pontuação, bloqueio, suspensão e exclusão da plataforma, bem como aos parâmetros que compõem o valor de sua remuneração, por meio de relatório mensal que detalhe a soma do tempo trabalhado, a remuneração total, a remuneração específica dos serviços realizados em horários de alta demanda, o valor médio da hora trabalhada e sua comparação com a remuneração mínima estabelecida no próprio PL n. 12/2024.

Os arts. 7º, I, e 8º do PL n. 12/2024, ao abordarem a transparência, em alguma medida, buscam alinhamento ao consignado no art. 5º, LXXIX, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988), incluído pela Emenda Constitucional (EC) n. 115/2022, cujo teor assegura o direito à proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais, e à Lei n. 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais  – LGPD).

Por outro lado, os arts. 7º, I, e 8º do PL n. 12/2024 proclamam uma obviedade: o trabalhador deve ter acesso a informações alusivas ao seu contrato de trabalho, apesar da suposta inexistência de vínculo empregatício. Somente dessa forma terá condições de eventualmente impugnar medidas adotadas pelas empresas ou discordar de valores recebidos.

O art. 7º, II, do PL n. 12/2024 determina que as empresas operadoras de aplicativo adotem medidas capazes de reduzir os riscos inerentes ao trabalho.

A proteção à saúde dos trabalhadores vinculados a empresas operadoras de aplicativos, sobretudo durante a pandemia, foi provocada por ações civis públicas de autoria de sindicatos e do Ministério Público do Trabalho (MPT). Os motoristas também promoveram movimentos nesse sentido.

Posteriormente, foi promulgada a Lei n. 14.297/2022 que previu medidas de proteção aos entregadores que prestavam serviços por intermédio de empresas de aplicativos de entrega durante a pandemia da Covid-19.

Esse ato normativo impôs às empresas operadoras de aplicativo o seguinte: contratação de seguro contra acidentes em benefício do trabalhador; assistência financeira em caso de afastamento do trabalhador por Covid-19; fornecimento de informações ao trabalhador sobre os riscos da Covid-19; fornecimento de máscaras e álcool em gel ou outro material higienizante aos trabalhadores.

O direito a saúde e segurança no trabalho é um direito fundamental garantido a todos os trabalhadores urbanos e rurais (CRFB/1988, art. 7º, XXII). O dispositivo utilizou a palavra “trabalhadores” em vez de “empregados”. Assim, a saúde e a segurança são direitos extensivos a todos os trabalhadores (e não apenas aos empregados), independentemente da existência de vínculo empregatício.

Portanto, a despeito da importância do disposto no art. 7º, II, do PL n. 12/2024, o direito a saúde e segurança de todos os trabalhadores, inclusive aqueles vinculados às empresas operadoras de aplicativos, é assegurado diretamente pela Constituição (art. 7º, XXII).

Talvez, o questionamento principal será como instrumentalizar esse direito de redução dos riscos ao trabalho conferido aos trabalhadores vinculados a empresas operadoras de aplicativo. Por ser um direito fundamental garantido na CRFB/1988 descaberá aguardar negociação coletiva para concretizá-lo. À partida, parece induvidosa a interpretação de que, por exemplo, às empresas caberão fornecer equipamentos de proteção individual (EPIs) aos trabalhadores, bem como adotar medidas concretas de proteção coletiva, capazes de amenizar os riscos inerentes às atividades de transporte, como os acidentes e os assaltos.

O art. 7º, III, do PL n. 12/2024 impõe às empresas a eliminação (aqui não é redução, mas extinção) de todas as formas de discriminação, violência e assédio no trabalho. A transparência no repasse de informações é uma medida necessária, contudo insuficiente para afastar quaisquer atos de violência contra os trabalhadores. As empresas deverão estruturar políticas internas efetivas e concretas contra práticas violentas no ambiente de trabalho e poderão ser responsabilizadas caso essas medidas sejam frustradas e haja dano ou risco de lesão aos trabalhadores.

O art. 7º, IV, do PL  n. 12/2024 assegura o direito à organização sindical, à sindicalização e à negociação coletiva. Às empresas, portanto, veda-se qualquer ato classificado como antissindical.

Por fim, o art. 7º, V e VI, do PL n. 12/2024 exige que as empresas operadoras de aplicativo abolem o trabalho infantil e o trabalho análogo à de escravo. Portanto, é de responsabilidade das empresas adotarem medidas concretas que impeçam que menores de idade se cadastrem e exerçam a atividade de motorista, bem como assegurar condições dignas aos trabalhadores capazes de impedir a prática de trabalho degradante.

Continuarei na próxima semana.

Bruno Gomes Borges da Fonseca
Bruno Gomes Borges da Fonseca
Pós-doutorado em Direito pela PUC-Minas; Pós-doutorado em Direito pela UFES; Doutor e Mestre em Direito pela FDV; Procurador do Trabalho na 17ª Região; Professor da FDV; Professor do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Pública da UFES; ex-Procurador do Estado do Espírito Santo

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