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7 de maio de 2024
terça-feira, 7 de maio de 2024
Bruno Gomes Borges da Fonseca
Bruno Gomes Borges da Fonseca
Pós-doutorado em Direito pela PUC-Minas; Pós-doutorado em Direito pela UFES; Doutor e Mestre em Direito pela FDV; Procurador do Trabalho na 17ª Região; Professor da FDV; Professor do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Pública da UFES; ex-Procurador do Estado do Espírito Santo

A inconstitucionalidade da tarifação do dano moral

A Lei n. 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) inseriu o Título II-A na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) cuja denominação é Do dano extrapatrimonial (arts. 223-A a 223-G).

Dano extrapatrimonial é uma expressão que se reporta ao gênero e agrega, entre outras, as seguintes espécies: dano moral individual; dano moral coletivo; dumping social ou dano social; dano estético; dano à imagem; dano existencial.

Um dos pontos mais polêmicos, relativo à inserção dos danos extrapatrimoniais na CLT, foi o estabelecimento de tetos de valores indenizatórios pelo art. 223-G, §1º, I a IV, §2º, da CLT, isto é, a definição do valor condenatório de acordo com a gravidade da lesão e o salário do ofendido.

Segundo o dispositivo, em caso de acolhimento do pedido, a Justiça do Trabalho fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação: a) ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido; b) ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido; c) ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido; d) ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido. Se o ofendido for pessoa jurídica, a indenização será fixada com observância desse parâmetros, porém em relação ao salário contratual do ofensor. Por fim, na reincidência entre partes idênticas, o juízo poderá elevar ao dobro o valor indenizatório.

Antes da inserção desse preceito na CLT, tanto o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram sobre a impossibilidade de estipulação de tetos para as condenações em danos morais.

O STJ, a tratar da tarifação da indenização por danos morais prevista na Lei n. 5.250/1967 (Lei de Imprensa), em 2004, editou a Súmula n. 281: “[…] a indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na lei de imprensa.”

O STF, em 2007, igualmente, decidiu nesse sentido ao julgar o recurso extraordinário (RE) n. 447.584/RJ cujo objeto também era a Lei n. 5.250/1967. Considerou que o estabelecimento do teto indenizatório previsto no art. 52 do aludido ato normativo não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988 (CF/1988 – arts. 5º, IV, V, IX, X, XIII e XIV, e 220, caput e §1º). A Corte registrou: “[…] Toda limitação, prévia e abstrata, ao valor de indenização por dano moral, objeto de juízo de equidade, é incompatível com o alcance da indenizabilidade irrestrita assegurada pela atual Constituição da República. Por isso, já não vige o disposto no art. 52 da Lei de Imprensa, o qual não foi recebido pelo ordenamento jurídico vigente.”

Posteriormente, em 2020, o STF, na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) n. 130/DF, declarou que a tarifação da indenização por danos morais, prevista na Lei de Imprensa (arts. 51 e 52), não foi recepcionada pela CF/1988.

O estabelecimento de valores de acordo com o salário do ofendido, conforme promoveu a Reforma Trabalhista, tornou ainda mais grave a situação, porquanto, por exemplo, uma idêntica ofensa moral sofrida por dois trabalhadores poderia gerar valores indenizatórios diferentes, a depender do salário de cada um, o que afronta a CF/1988 cujo texto assegura a igualdade e proíbe a discriminação e a distinção entre trabalhadores de atividades manuais, técnicas e intelectuais (arts. 5º, caput, 7º, XXXXI, XXXXII e XXXXIII).

Os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) estão admitindo incidentes de arguição de inconstitucionalidade relativos a tarifação das indenizações decorrentes de danos extrapatrimoniais prevista na CLT:  ArgInc n. 00005140820205080000 (TRT da 8ª Região), ArgInc n. 00002397620195230000 (TRT da 23ª Região), ArgInc n. 000210899420165040030 (TRT da 4ª Região), ArgInc n. 00115216920195030000 (TRT da 3ª Região), ArgInc n. 10047522120205020000).

No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a Quinta Turma admitiu incidente de arguição de inconstitucionalidade alusivo à tarifação das indenizações por danos extrapatrimoniais e encaminhou os autos para o Pleno (recurso de revista n. 10801-75.2021.5.03.0148) cujo julgamento ainda não ocorreu.

No plano teórico, de igual modo, houve expressivo posicionamento no sentido da inconstitucionalidade do teto indenizatório introduzido pela Reforma Trabalhista. Destacam-se, nesse sentido, os Enunciados n. 18, n. 19 e n. 20 da 2ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho.

Nesse cenário, era de se supor que o dispositivo fosse declarado inconstitucional pelo STF, quando do julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) n. 6069, n. 6050 e n. 6082.

Em 26.6.2023, o STF, em sessão virtual, por maioria de votos, julgou parcialmente procedentes os pedidos para conferir interpretação conforme a Constituição, de modo a estabelecer que “[…] os critérios de quantificação de reparação por dano extrapatrimonial previstos no art. 223-G, caput e § 1º, da CLT deverão ser observados pelo julgador como critérios orientativos de fundamentação da decisão judicial. É constitucional, porém, o arbitramento judicial do dano em valores superiores aos limites máximos dispostos nos incisos I a IV do § 1º do art. 223-G, quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade”.

Portanto, a Justiça do Trabalho, quanto aos pleitos de danos extrapatrimoniais, o que inclui o de dano moral, não está limitada às prévias quantificações estabelecidas pela Reforma Trabalhista, de sorte que poderá fixar valores indenizatórios superiores diante das circunstâncias do caso.

Bruno Gomes Borges da Fonseca
Bruno Gomes Borges da Fonseca
Pós-doutorado em Direito pela PUC-Minas; Pós-doutorado em Direito pela UFES; Doutor e Mestre em Direito pela FDV; Procurador do Trabalho na 17ª Região; Professor da FDV; Professor do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Pública da UFES; ex-Procurador do Estado do Espírito Santo

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