No mês de novembro de 2025, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima — a COP30 — reuniu representantes de quase 200 países em Belém, Pará (Brasil) para debater urgências ambientais, crises sociais e o futuro da criação. Ao final, em 22 de novembro, foi aprovado por consenso o chamado Pacote de Belém, composto por 29 decisões que pretendem orientar a ação climática global nas próximas décadas.
As medidas aprovadas incluem: aumentar o financiamento para adaptação às consequências da crise climática nos países vulneráveis; promover uma “transição justa” para economias de baixo carbono; criar mecanismos de valorização da preservação ambiental, como o Fundo Florestas Tropicais para Sempre; e integrar dimensões de comércio, gênero, tecnologia e justiça social na agenda climática.
Toda essa mobilização global — com seus avanços e limitações — nos convida, como cristãos, a uma reflexão séria: o que significa a crise climática para quem professa fé em Deus? E, nesse contexto, surge um chamado claro: o da mordomia da criação.
1. A criação pertence a Deus; nós somos apenas mordomos
Desde as primeiras páginas das Escrituras, Deus declara: “Cuidem do Jardim” (cf. Gênesis 1–2). A Terra não é nossa propriedade absoluta, mas dom divino confiado para administração fiel. A soberania de Deus sobre a criação implica responsabilidade nossa: não para explorá-la sem freio, mas para preservar, respeitar e sustentar a vida — humana e não-humana.
Quando a COP30 convoca nações e povos a proteger florestas, reduzir emissões, defender o meio ambiente e cuidar dos vulneráveis — ela, ainda que secular, ecoa esse instinto bíblico de mordomia. Para o cristão reformado, esse discurso não deve ser rejeitado por “ser político”: é um chamado à fidelidade ao Criador.
2. A crise climática revela as consequências do pecado e da negligência humana
A devastação ambiental, o desmatamento, a poluição, o sofrimento de populações vulneráveis — tudo isso denuncia a corrupção da criação por causa do pecado humano. Quando ignoramos nossa responsabilidade, a criação geme, e os sofrimentos recaem sobre os mais pobres e fragilizados (as minorias, comunidades tradicionais, indígenas, pobres, marginalizados).
A COP30, ao direcionar fundos de adaptação e favorecer a “transição justa”, reconhece — ainda que parcialmente — essas injustiças. Como igreja, precisamos confessar que parte da degradação ambiental nasce da ganância, da ambição desordenada e da negligência moral. A conversão cristã exige arrependimento não apenas pessoal, mas comunitário e cultural: mudar mentalidades de consumo, de descarte, de indiferença.
3. Cuidado com a criação como expressão do amor ao próximo
No Brasil — especialmente em estados com natureza abundante como o Espírito Santo — a crise climática se manifesta não apenas em gráficos globais, mas em rios poluídos, enchentes, desastres ambientais, vulnerabilidade social, precariedade das populações ribeirinhas, quilombolas, indígenas, pescadores etc.
Para o cristão, amar o próximo não é opcional: é mandamento. E amar o próximo inclui defender suas condições de vida dignas — terra limpa, água, ar saudável, segurança alimentar e ambiental. A mordomia da criação torna-se, então, ética de compaixão, justiça e solidariedade.
4. A geração futura importa: responsabilidade intergeracional
Cuidar da criação hoje é um legado para nossos filhos e netos. A fé reformada valoriza a herança espiritual e material a ser transmitida: não apenas a norma moral e a doutrina, mas também um mundo digno de ser habitado, um ambiente de justiça e vida.
A COP30 tenta criar mecanismos para que essa responsabilidade seja assumida globalmente — e como igreja local, precisamos ensinar às novas gerações que cuidar da Terra não é “luxo ecológico”, mas mandato cristão, parte do discipulado, da mordomia e da fidelidade.
5. Testemunho cristão e vocação pública da igreja
Embora a COP30 seja conferência secular, suas decisões exigirão implementação concreta — nas políticas públicas, nas economias locais, nas decisões cotidianas. A igreja não pode se omitir. A fé bíblica nos envolve com todas as esferas: social, econômica, ambiental, cultural.
Quando o cristão se engaja em ações sustentáveis, apoia políticas públicas que protegem a criação, valoriza a floresta, denuncia injustiças ambientais e defende os vulneráveis — ele está vivendo o Evangelho em poder. A mordomia da criação torna-se, então, parte do nosso testemunho, missão e vocação pública.
Cuidar da criação é aplicar o Evangelho de Jesus Cristo
A COP30, com o Pacote de Belém, nos traz de volta um sinal de esperança: mesmo num mundo dividido, é possível haver consenso para proteger o planeta e valorizar a vida. Mas, por si só, essas decisões não bastam. Elas precisam ser traduzidas em conversão, cuidado, compromisso — por parte de governos, comunidades e cada indivíduo.
Para nós cristãos reformados — que cremos em um Deus soberano sobre a criação — não se trata de discutir “meio ambiente versus economia”, nem de adotar uma agenda política. Trata-se de obedecer a Deus: administrando bem o mundo que Ele nos confiou, cuidando dos nossos irmãos, preservando o que é vida.
Se antes o Cristianismo foi acusado de negligenciar a criação conforme se projetava como “espiritual demais”, hoje é urgente redescobrir a vocação bíblica da mordomia. Que a igreja no Espírito Santo — e no Brasil — se levante: não como militante política, mas como sal e luz.
E que, com a graça de Cristo, entendamos: cuidar da Terra também é colocar em prática o Evangelho.











