A decisão recente do Vaticano de rejeitar oficialmente o título de “corredentora” para a Maria repercutiu no mundo cristão como uma reafirmação do essencial: a redenção pertence unicamente a Jesus Cristo.
No documento Mater Populi Fidelis, aprovado pelo papa Leão XIV, o Dicastério para a Doutrina da Fé destacou que Maria é mãe, serva e exemplo de fé — mas não coautora da salvação. “Não seria apropriado usar o título de corredentora”, diz o texto, “pois ele cria confusão e desequilíbrio na harmonia das verdades da fé cristã”.
À primeira vista, pode parecer apenas uma questão interna da Igreja Católica. Mas para quem lê o Evangelho à luz da Reforma, essa afirmação ecoa com força espiritual e bíblica.
O apóstolo Paulo foi direto ao declarar: “Há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (1Tm 2.5). É a mesma verdade que moveu Martinho Lutero, João Calvino e tantos outros reformadores: a salvação é de Cristo, por Cristo e para Cristo — e a Ele somente seja toda a glória.
Calvino escreveu que “Maria não é redentora, mas discípula; agraciada não por mérito, mas pela pura misericórdia de Deus”. R. C. Sproul também lembrava que o princípio do solus Christus é o coração do Evangelho: “Acrescentar qualquer outro mediador, mesmo o mais piedoso, é obscurecer a suficiência do Cordeiro”. E John Piper, em um sermão sobre a cruz, resumiu assim: “Não há espaço para co-redentores onde o sangue de Cristo foi suficiente”.
Redentora, não. Exemplo de fé, sim!
Isso não diminui Maria. Pelo contrário — devolve-lhe o brilho bíblico e humano que o Evangelho lhe confere. Maria é modelo de fé, não mediadora da graça; é serva obediente, não parceira da redenção. Sua grandeza está justamente em ter dito: “Eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1.38). Como afirmou o papa Francisco em 2020, “Maria nunca quis tirar nada de seu Filho para si mesma”. Ela nos ensina o caminho da humildade e da confiança absoluta em Deus.
Diálogo e aproximação
Para os cristãos protestantes, a notícia vinda de Roma é uma oportunidade de diálogo e aproximação, e não de polêmica. Num tempo em que as fronteiras entre tradições parecem muros intransponíveis, talvez seja hora de celebrar o que nos une: o nome de Jesus de Nazaré, o único que salva. Como disse o apóstolo Pedro: “Em nenhum outro há salvação, porque debaixo do céu nenhum outro nome foi dado entre os homens pelo qual devamos ser salvos” (At 4.12).
Num mundo cansado de salvadores improvisados e discursos que prometem redenção sem cruz, a clareza do Evangelho é um alívio. Não há dois redentores. Há um só. E é por isso que o coração daquele que ama a Palavra de Deus se alegra: porque, quando o centro da fé cristã volta a ser Cristo, todos nós ganhamos. Católicos, evangélicos e ortodoxos — todos os que confessam Jesus como Senhor — encontram nesse reconhecimento um ponto de encontro e de esperança.
No fim das contas, como disse Calvino, “Cristo não é apenas o autor da nossa salvação, mas também o seu perfeito consumador”. E é nesse nome — o nome sobre todo nome — que repousa a fé que nos une, redime e reconcilia.
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