Thiago Sobrinho – [email protected]
Nas duas primeiras vezes que deu a luz, a arquiteta Kamila Zamborlini, 32, até cogitou que seus filhos nascessem por parto normal. Apesar do desejo, os planos esbarraram na orientação dos médicos e a cesariana foi realizada. “Os dois partos que tive foram mais ou menos a mesma coisa:: o primeiro cheguei a esperar a madrugada inteira para dar a luz e, no segundo, como eu não tinha dilatação, já cheguei ao hospital e fui fazer a cesárea”, contou a mãe, que hoje espera o seu terceiro bebê.
Assim como Kamila, outras gestantes recorrem à rede privada para ter seus filhos e acabam passando por procedimentos cirúrgicos. A comodidade, o receio de que a criança seja ferida no parto normal e, principalmente, o medo da dor são alguns dos fatores que tornam o Brasil campeão de taxas de cesáreas: 84% dos brasileiros que chegam ao mundo dentro de hospitais particulares são através de cesáreas.
Esses dados contradizem o que preconiza a Organização Mundial da Saúde (OMS): a OMS recomenda que apenas 15% dos partos realizados em nosso país sejam cesarianas. Para tentar reduzir esse número e estimular o parto normal entre as mulheres, as novas regras da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) começam a valer a partir desta segunda-feira (6).
As novas determinações do governo irão obrigar os hospitais particulares a utilizarem o partograma, que é uma marcação gráfica onde o médico irá acompanhar a gestante e saber se o parto está normal ou anormal. Com isso, os procedimentos cirúrgicos serão realizados apenas se houver a complicações que dificultem o parto normal.
Outra medida é obrigar os planos de saúde a fornecer às gestantes dados sobre a quantidade de cesarianas e partos pelo método normal feitos pelos médicos e hospitais conveniados. Assim, as mães poderão se informar e escolher aqueles profissionais que atendam ao seu desejo de dar a luz pelo parto normal. O prazo para disponibilizar essas informações é de 15 dias e os planos de saúde que se recusarem a liberá-los podem ser multados em R$ 25 mil.
Segundo o médico e membro da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia do Espírito Santo (Sogoes), Henrique Zacarias, além de diminuir os índices de cesarianas em nosso país, a resolução da ANS chega para proteger a vida das gestantes. “Já sabemos que a mãe que faz cesárea tem um risco de morte quatro vezes maior do que aquela que faz o parto normal”, destacou.
Ainda de acordo com Zacarias, os médicos e hospitais que não reduzirem seus números podem sofrer as consequências. “Aqueles que não melhorarem seus indicadores de cesariana serão punidos. O que não pode é continuar com essa farra”, criticou obstetra e também diretor do Hospital Maternidade da Unimed em Vitória.
Todos os meses, cerca de 200 mães chegam ao Hospital da Unimed, localizado na capital, para dar a luz. Desse total, apenas 34 partos são normais – que significam 17% dos nascimentos mensais na unidade – e os outros 166 capixabas nascem a partir da cesárea.
A Unimed Vitória informa que tem buscado estimular a realização de partos normais entra suas clientes com medidas para criar um cenário ainda mais adequado e seguro para as mães. Entre as medidas adotadas, está a construção de um espaço totalmente adaptado no Hospital-Dia e Maternidade Unimed (HDMU), com salas de parto humanizado preparadas.
A cooperativa destaca ainda que recentemente foi escolhido ao lado de outro hospital do Estado para receber o Projeto Parto Adequado. A iniciativa é desenvolvida pela ANS, Hospital Israelita Albert Eistein (HIAE) e pelo Institutie for Healthcare Improvement (IHI). O projeto Parto Adequado tem como objetivo identificar modelos inovadores e viáveis de atenção ao parto e nascimen to na saúde suplementar brasileira, baseados nas melhores evidências científicas disponíveis e em experiência exitosas.
Mesmo que o Brasil viva uma verdadeira epidemia de cesáreas, Henrique Zacarias acredita que esse panorama pode mudar. “Com o passar dos anos, as pessoas vão entender o que é o melhor para elas. Essa situação não pode ficar do jeito que está”,
Mãe opta pelo parto normal
Para viver a experiência de ser mãe pela primeira vez, a advogada Emanuelle S., 31, optou pelo parto normal. Grávida de sete meses da Vitória, a decisão foi tomada depois de muita pesquisa e orientação com amigas e familiares. “Colhi informações logo que descobri a gravidez. Como eu planejei a gravidez, eu já pensava na possibilidade de parto normal antes”, explicou a mãe.
Para levar sua vontade adiante, Emanuelle chegou a trocar de médica. A decisão foi tomada depois que a advogada percebeu que profissional a levaria realizar uma cesárea sem necessidade. “Descobri quando a fiz uma pergunta e ela disse que não faria o parto normal naquelas condições. Conversei com amigas que tinham feito parto naquela mesma situação. Pelo sim, pelo não resolvi trocar”, disse.
Um dos fatores que a motivaram levar em frente a decisão foi a possibilidade de acompanhar a filha em seus primeiros dias. “A minha preocupação (com a cirurgia) é ter de ficar um tempo me recuperação ter tempo de desfrutar minha filha. Com a cesárea, eu tenho certeza que ficaria no mínimo 40 dias em cima de uma cama me recuperando e isso é uma coisa que tenho pavor”, comentou Emanuelle.
Mesmo sabendo que, assim como aconteceu com ela, os médicos acabam influenciando na decisão das grávidas, a futura mamãe ainda acredita que parto normal é a melhor opção par a se dar a luz. “O parto tem de ser uma interação da mãe com o bebê. A mulher nasce pronta para parir, então não tem necessidade de intervenção cirúrgica”, finalizou.