Fortaleza (CE) – Enquanto algumas semanas de moda estão perdidas e sem saber o que fazer para recuperar público e superlatividade, o Dragão Fashion Brasil, em seu 2º ano sob a alcunha de festival, parece ter encontrado de vez uma possível resposta indo além desfiles e abraçando empreendedorismo, gastronomia e música. Em sua 19ª edição, investiu R$ 2 milhões, com 38 desfiles, 16 atrações musicais e 50 expositores. Noves fora, a genuína moda tupiniquim contemporanizada é que vale o ingresso em Fortaleza (CE).
A começar por Almerinda Maria, que ao som de jazz e bossa nova entregou uma coleção com seu meticuloso trabalho de aplicação de renda renascença, um estilo de bordado feito exclusivamente à mão, com traços marcantes, em que predominaram pontos exclusivos e entrelaçados delicados, projetando desenhos em linhas sinuosas e divergentes.
Outra boa parte da coleção veio com bordados richelieu, uma técnica tão antiga que atribuí-se ao Cardeal Richelieu, que integrava a corte do Rei Luis XIII. Abusando de muito linho e seda pura, Almerinda fugiu finalmente do já batido vestidão bordado – à lá Martha Medeiros – e se entregou a um lindo stylist moderno, com pegada work e street, apesar da inspiração românticas, de golas altas e uns laços aqui e acolá.
Esse bairrismo fashion, onde a mão delicada do nordeste nada contra a maré de um mercado têxtil preguiçoso para valorizar a moda em seu cerne artesanal, na vagareza do bordado e na mão avermelhada de tantos vai e vens de agulha, é que fazem da passarela do Dragão afetuosa. Não à toa Ronaldo Silvestre decidiu contar a história de mulheres que marcaram sua vida, também se entregando à seda artesanal, com direito a renda setentinha feita à mão, ao lado de bordados, drapeados e crochês.
Não por menos, Ivanildo Nunes pendurou mandalas em sua moda festa para materializar o cosmo, e fez do tule, de organza e da renda francesa meras coadjuvantes assim que caíram nas mãos das bordadeiras cearenses que, no feito à mão e no desenho de superfície, fizeram mais que roupa: entregam sentimento e vestiram uma típica princesa da Disney….recém-saída do Cariri.
Na moda masculina, onde as técnicas de outrora não são tão palatáveis, David Lee buscou em sentimentos o norte da coleção, trabalhada em viscose, sarja, algodão, linho e crochê. O stylist urbano foi impecável com crochês mal pendurados e amarrados, e nas sensacionais sobreposições, de mesmo material, com cara de patchwork. A estamparia em algodão de caça-palavras com marca texto, com jeito de mal acabada e ao mesmo tempo delicada, merecem virar coqueluche do street style brasileiro.
Porque o dragão alçou voo ecoando que a importância de uma mão de obra e a resistência de uma cultura valem mais que um “see now buy now”. Fica então a pergunta: do que vale comprar no imediatismo, se o sentimento de cada agulhada não vir junto?
*O jornalista viajou a convite do DFB Festival