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Nova escala ajuda a triagem e a estruturar atendimento à saúde mental no SUS

Uma nova ferramenta pode transformar a maneira como o Brasil lida com a saúde mental no SUS (Sistema Único de Saúde). A Escala Brasileira de Avaliação das Necessidades de Cuidado em Saúde Mental (CuidaSM), criada por pesquisadores do Einstein Hospital Israelita, é uma tentativa de ajudar a atenção primária a identificar, entre os milhões de brasileiros que sofrem com problemas como ansiedade e depressão, aqueles que necessitam de atendimento especializado ou que podem receber assistência já nessa instância.

O questionário com 17 itens foi desenvolvido ao longo de quatro anos pelo Einstein no âmbito do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi-SUS), que apoia iniciativas de um grupo de hospitais filantrópicos de excelência em colaboração com o Ministério da Saúde, em contrapartida à imunidade tributária dessas organizações.

O instrumento, descrito em artigos nos periódicos científicos PLOS One e Revista de Saúde Pública, foi testado em mais de 800 usuários da atenção primária em 11 serviços de saúde distribuídos por Goiás, Maranhão e Rondônia.

Na pesquisa, os pacientes foram classificados em três estratos: 47% tinham “necessidade leve”, com tensões ou sofrimento pontual, preservando funcionalidade no dia a dia; 36% estavam em “necessidade moderada”, com quadros persistentes que afetam a rotina e exigem acompanhamento na Unidade Básica de Saúde (UBS); e os 17% restantes tinham “necessidade grave”, com prejuízo acentuado e necessidade de cuidado em serviços especializados, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

O conjunto desses caminhos é o que as autoras chamam de “escalonamento do cuidado”.
Segundo a psiquiatra Joana Mendonça, uma das coordenadoras do desenvolvimento da ferramenta no Einstein, o grande desafio é organizar as redes de atenção a partir das necessidades reais da população, não do que o sistema tem para oferecer.

“A gente precisa saber quais são as pessoas que têm um cuidado que, de fato, só o especialista pode resolver. Não tem como a gente colocar os especialistas – psicólogos, psiquiatras, enfermeiros especializados em saúde mental – para atender toda necessidade de cuidado em saúde mental.”

O processo de desenvolvimento da CuidaSM envolveu ainda oficinas com 73 profissionais de saúde de diversas especialidades, aplicou testes de validação de conteúdo, analisou a estrutura interna com técnicas estatísticas e padronizou escores.

Tudo isso para achar uma maneira de lidar com um problema crescente: só em 2024, houve mais de 471 mil afastamentos do trabalho por problemas de saúde mental, o maior número em pelo menos uma década e um aumento de 66% em relação a 2023, segundo dados do INSS tabulados pela iniciativa SmartLab.

A CuidaSM propõe uma mudança na abordagem da saúde mental ao desbancar o modelo tradicional, baseado exclusivamente em diagnósticos psiquiátricos. As questões avaliam dimensões da vida do paciente como relações sociais, funcionalidade, autonomia, impulsividade, agressividade e espiritualidade – aspectos que determinam o real impacto do sofrimento mental na vida cotidiana. Também há itens relacionados a comportamentos violentos, fundamentais para identificar casos com histórico de violência ou tendência suicida.

“Nós não fazemos perguntas diagnósticas. A escala aborda dimensões da vida que são afetadas ou afetam a sua saúde mental. E estamos falando sobre saúde mental, não sobre o processo de adoecimento”, explica a enfermeira Ana Alice de Sousa, coordenadora do projeto no Einstein.

Essa abordagem permite identificar pessoas em sofrimento que ainda não desenvolveram um quadro depressivo de fato, por exemplo, mas que precisam de cuidados para evitar o agravamento da condição. Nós não fazemos perguntas diagnósticas. A escala aborda dimensões da vida que são afetadas ou afetam a sua saúde mental. E estamos falando sobre saúde mental, não sobre o processo de adoecimento”, disse a
enfermeira e coordenadora do projeto no Einstein Hospital Israelita.

José Eudes Barroso Vieira, diretor de Estratégias e Políticas de Saúde Comunitárias do Ministério da Saúde, ressalta a importância da ferramenta para o sistema público. “A atenção primária à saúde (APS) é a porta de entrada preferencial e a coordenadora do cuidado em saúde no SUS, inclusive com atuação direta na saúde mental, com identificação precoce de sinais de sofrimento psíquico, manejo de casos e articulação com os demais serviços no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial. A incorporação da escala CuidaSM surge como uma inovação na oferta de orientações para a avaliação das necessidades de cuidado em saúde mental com uma abordagem ampliada, que considera múltiplos fatores para além dos sintomas ou diagnósticos”.

Segundo Vieira, o país conta hoje com 55.140 equipes de saúde da família, 36.756 equipes de saúde bucal e mais de 13.000 outras equipes multiprofissionais cofinanciadas, todas potencialmente aptas a utilizar a ferramenta.

“A atenção primária tem que conseguir cuidar das condições mais comuns. Ninguém pensa que tem que ter um cardiologista para todo hipertenso, um endocrinologista para todo diabético. Se o CAPS estiver lotado de condições comuns, quem vai atender as condições graves que precisam de mais intensidade e cuidado?”, argumenta Mendonça.

O plano é que a aplicação da CuidaSM seja periódica, mantendo o plano de cuidados do paciente atualizado, uma vez que as necessidades individuais podem mudar ao longo do tempo, explica Sousa. Mais estados, como São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, devem iniciar a aplicação até 2026, com expansão gradativa para abranger todo o território nacional.

Segundo as autoras, a escala tem ainda potencial para reduzir o estigma associado à saúde mental. Ao enfocar necessidades de cuidado em vez de diagnósticos psiquiátricos, a ferramenta tenderia a facilitar a busca por ajuda e a estimular tanto pacientes quanto profissionais de saúde não especializados a abordar questões que antes eram tabu.

O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde.

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – GABRIEL ALVES

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