Consciência Negra e a vontade de Deus, por Gustavo Siqueira*
No dia 20 de novembro é comemorado o Dia da Consciência Negra, uma oportunidade para refletirmos sobre o passado e o presente do povo afro-brasileiro.
Os primeiros registros históricos de tráfico de pessoas negras escravizadas em terras brasileiras são do ano 1550 aproximadamente. De lá para cá, segundo o IBGE, o “Brasil foi o país que mais importou pessoas africanas para o continente americano. Entre os séculos XVI e meados do XIX, vieram 4 milhões de pessoas”.
Estas pessoas foram sequestradas de seus lares e famílias, trazidas contra sua vontade para uma terra distante para serem exploradas, objetificadas e impedidas de exercerem qualquer liberdade. Elas foram torturadas, sofrendo toda sorte de abuso.
Para nossa vergonha, o Brasil foi o último país do Ocidente a abolir a escravidão, o que só aconteceu com muita luta e resistência das pessoas negras, que por fim resultou na assinatura da Lei Áurea em 1888.
Porém, a assinatura da Lei Áurea apenas declarou o fim da escravização de pessoas negras. Não houve nenhum tipo de indenização pelos mais de trezentos anos de sofrimento ou política pública que os inserisse na sociedade. Foram abandonados à própria sorte sem ter onde morar, sem trabalho, ou fonte de renda alguma. Foram obrigados a viver às margens da sociedade, construindo seus barracos em morros e manguezais, enquanto as elites brasileiras patrocinavam migrações europeias a fim de embranquecer o povo brasileiro.
Mais de trezentos anos de escravidão, desprezo e objetificação deixaram marcas profundas em como este povo foi e ainda é tratado na sociedade brasileira, gerando falta de oportunidades e desigualdades mostradas nas estatísticas do IBGE. Desigualdades que estão nas bases estruturais da sociedade brasileira, deste sistema que simplesmente parece não favorecer os mais pobres, que em sua maioria são de pretos e pardos.
Talvez você esteja achando este papo muito politizado e se perguntando: “Ok, mas o que a Igreja tem a ver com isso?”. Tem tudo a ver! Vejamos uma verdade profunda que as Escrituras nos ensinam:
“Assim sendo, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vocês são um em Cristo Jesus.”
(Gálatas 3:28)
Percebemos aqui que a vontade de Deus para nós é que não haja mais sentimento de superioridade, nem de desprezo de uma etnia para outra, nem de status social ou gênero. Diante de Deus todos são iguais.
E a pergunta que fica para nós é: “O que podemos fazer para que esta vontade de Deus sobre a igualdade das pessoas a despeito de sua raça ou etnia seja feita ‘na terra como no céu’?”
A missão principal da igreja é anunciar a mensagem eterna Evangelho e nossa pregação precisa vir acompanhada de atitudes que ilustrem esta mensagem. Para isto precisamos sinalizar o Reino de Deus ajudando a desfazer as desigualdades estruturais e injustiças históricas que atingem milhões de pessoas herdeiras do sangue africano em nosso país.
Tendo como exemplo prático disso personagens históricos como o pastor Martin Luther King Jr. que foi um grande ativista dos direitos civis nos Estados Unidos, a atuação das igrejas brasileiras precisa levar em consideração o contexto de pecados e injustiças estruturais na sua pregação do Evangelho, atuando junto às comunidades com reforço escolar, assistência com alimentos, esportes e na luta por direitos básicos.
Cabe a nós refletirmos sobre as heranças históricas de nosso país e anunciar a mensagem libertadora de vida abundante de maneira contextualizada, para que a vontade de Deus seja conhecida e praticada, para que “assim brilhe a nossa luz diante dos homens e eles deem glória a nosso Pai Celeste” (Mateus 5.16).