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25 de novembro de 2025
terça-feira, 25 de novembro de 2025
José Cirillo
José Cirillo
José Cirillo é doutor em Comunicação e Semiótica (PUC-SP), mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES,) onde é professor titular e coordenador do Programa de Pós-graduação em Artes. Pós-doutor em Artes pela Universidade de Lisboa. Foi Pró-reitor de Extensão da UFES (2008-2014); Diretor do Centro de Artes (2005-2008). Atua como coordenador do Laboratório de Extensão e Pesquisa em Artes (LEENA), desenvolvendo pesquisas sobre a arte e a cultura capixaba.
A opinião dos colunistas é de inteira responsabilidade de cada um deles e não reflete a posição de ES Hoje

UMA VOZ SILENCIADA: mas “obrigado por todo o bem”

5 de setembro de 2025. Está manhã foi atravessada pela surpresa e a dor de perder Maria Helena Lindenberg. Ela lutava bravamente para contornar os desgastes de uma doença avassaladora. Mas, antes de se despedir de todos nós, ela deixou sua marca no estado.

Na imagem a seguir, diante de uma fotografia de Frida Kahlo, Maria Helena foi capturada com seu olhar de quem sempre tinha uma interrogação na cabeça. Sempre questionando o presente, tomada pela experiência e pela projeção de um futuro mais inclusivo para a nossa arte e nossos artistas.

UMA VOZ SILENCIADA: mas “obrigado por todo o bem”

Sua dedicação ao mundo da arte e da cultura capixaba desenhou uma trajetória sem precedentes e com marcas eternas na nossa cultura. Quando entrei no Centro de Artes ela já havia se aposentado, mas isto não significou se afastar do protagonismo no Estado. Aliás, sua geração não conhece o anonimato ou a paralização.

Que o digam Tereza Norma e Cecilia Nascif. Uma geração de mulheres fortes e determinadas a mudar a visão do nosso estado e da nossa arte. Tenho o privilégio de conhecer e admirar todas!

A voz dos amigos

Tive o privilégio de ouvir alguns amigos de Maria Helena ao longo dessa sexta de dor para todos nós. E mesmo com meu pulso quebrado, eu não poderia deixar de usar o espaço de minha coluna no ES HOJE, para fazer essa pequena homenagem a esta mulher exemplar. E contei com a ajuda de alguns de seus afetos.

Eu não tinha como ouvir todos, mas os que aqui colaboram, falam de coisas compartilhadas por todos nós. Maria Helena formou gerações ao logo de sua vida, alguns deram-me um depoimento que compartilho com todos, nesse momento de dor e de homenagens a esta mulher.

Inicio essa voz dos amigos com a frase de Teresa Norma Tomazzi (amiga, parceira, irmã de coração de Maria Helena): “Obrigado por todo o bem”.

Joyce Brandão, também sob a dor da perda da amiga, me sintetizou, nessa tarde triste de sexta, um pouco sobre essaartista dedicada ao Desenho, à Gravura, “mas sobretudo empenhada em divulgar e dar suporte às artes plásticas no estado do Espírito Santo.” Joyce destaca que Maria Helena sempre foi dedicada ao cenário artístico, como na criação e fundação do Sindicato dos artistas SINDIAPPES; quanto a seu papel determinante para a criação do MAES, Museu de Arte do Espírito Santo, cuja demanda “exigiu muitos esforços.”

Sobre esses temas, Celso Adolfo, outro íntimo amigo e ex-aluno, complementa: “uma das maiores coisas que me pesa, quando fala Maria Helena, foi a luta pelo MAES. Nossa, por cinco governadores, cinco vezes quatro, vinte anos vinte anos a gente indo ao Palácio Anchieta e Maria Helena encabeçando pela inauguração do MAES, para ele funcionar, com curadoria, tudo, a ligação dela com o Paulo Herkenhoff e Mauricio Salgueiro também foi fundamental.

Aqui tomo novamente a fala de Joyce, que nos lembra que Maria Helena era uma “artista atuante, incansável, sempre à frente de eventos importantes que colocaram o estado do ES no cenário nacional.  Um desses, vale lembrar, o projeto “Artista Visitante” que nos colocou em contato com artistas de outros estados e no qual contamos com muito apoio de Maria Helena, abrindo um espaço importante de convivência e aprendizado. Hoje, muito do legado que temos nas artes, devemos à ela, que sempre buscou obstinadamente estar presente neste cenário.Temos todos muito a agradecer pelo seu amor, dedicação, devoção mesmo, à sua missão de vida.

UMA VOZ SILENCIADA: mas “obrigado por todo o bem”

Como agente da nossa arte, Maria Helena trafegava em horizontes múltiplos: arte na galeria (no velho cubo branco), mas também nas ruas (foi promotora do Salão Bienal do Mar de 2009, que ocorreu nas ruas de Vitória); mas também trafegava pelas interfaces da moda e da nossa expressão estética em campos distintos. Juntamente com Samira Margotto, conduziu uma das mais espetaculares edições do Salão do Mar, de 2009, mostra que revelou para o Brasil o artista Piatan Lube, revelando sua preocupação com a arte contemporânea, mas reforçando sua ação de mecenato – a qual praticava desde seus tempos de professora ou diretora do Centro de Artes. Joyce Brandão reconhece nela a mola propulsora de sua carreira como artista e como professora também do Centro de Artes.

Samira Margotto, hoje longe nas “amazônias” de Porto Velho, lamentou a perda da amiga, separada pela distância de um pais que não lhe permite dar-lhe um último adeus. Mas, compartilhou comigo algumas palavras sobre esta mulher espetacular. Para Margotto, que chorava enquanto falava hoje para mim, “Maria Helena Lindenberg contribui para o ambiente artístico muito além do que foi oficialmente registrado. Sua memória fenomenal, ajudou muitos pesquisadores, seu espírito vibrante e livre de amarras, faziam dela uma artista sempre aberta ao novo, disposta a aprender, ensinar e executar projetos com uma força descomunal. Fui estagiária dela na década de 1990, depois já formada, trabalhamos juntas na Secretaria Municipal de Cultura de Vitória, tenho profunda gratidão por tudo que nossa convivência me proporcionou.”

A historiadora da arte, Almerinda Lopes, amiga de muitos anos e parcerias, conversou comigo de Quito, no Equador. Lamento muito a morte de Maria Helena pela pessoa humana que ela era e pelos trabalhos memoráveis que ela prestou à cultura do Espírito Santo. Maria Helena foi uma professora extremamente respeitada, competente, diretora da UFES, chefe do departamento, sempre colaborou com inúmeros projetos da universidade e mesmo extra-UFES. Maria Helena foi diretora da Galeria Homero Massena, coordenou os trabalhos durante vários anos, manteve contatos com muitos artistas, ela tinha esses contatos desde o período que ela participou do Festival do Inverno de Ouro Preto. Foi sempre uma pessoa muito ativa, uma artista também que trabalhou durante vários anos, fez algumas exposições, e foi a pessoa que mais contribuiu também, que mais se empenhou para que o mais fosse criado o museu que hoje é o único museu que nós podemos dizer que faz um trabalho pela arte, pelas artes visuais, no Espírito Santo, no Museu de Ponta, enfim”.

Juntas, Almerinda e Maria Helena desenvolveram projetos e curadorias sobre a arte no Espírito Santo. Termina sua fala, com muita emoção, desejando que Deus a acolha em sua nova morada.

Para Attilio Colnago, “Helena foi uma pessoa sempre à frente do seu tempo, seja na vida dela pessoal como mulher e como artista e professora de arte, dona de um desenho impecável, uma gravura sempre na área de litografia com uma técnica também impecável e ela procurava sempre nas aulas trazer para os alunos uma visão e uma discussão mais contemporâneas, seja na área do desenho que ela trabalhava com o desenho, seja na produção de litografia. E o trabalho que ela fez importante”.

Attílio também reitera, como Celso Adolfo, o papel de Maria Helena para a criação do Museu de Artes do Espírito Santo (MAES), como também para outros espaços de preservação da nossa memória, como a criação e preservação do Museu de Arte Sacra, no Solar Monjardim.

Termino este texto, não por falta do que falar ou compartilhar sobre esta mulher ímpar, mas porque nenhum espaço seria suficiente para traçar o papel de Maria Helena no cenário artístico capixaba. Vou finalizar reproduzindo um trecho da minha conversa com Alda Pessotti, ainda nas primeiras horas da dolorida notícia da passagem da nossa Helena (como a chama Attilio). Alda, entre muitas falas históricas, destaca a origem da formação de Maria Helena e um pouco do seu percurso na UFES.

Maria Helena foi das primeiras turmas de artes plásticas. E ela, na federalização da Universidade, em 1961, entra como voluntária, sabe, para ajudar Crepaz, você acredita? E, depois, ela vai trabalhar com gravura, até se efetivar como auxiliar de ensino. Então, ela assistiu à federalização da Universidade, era colega de Tereza Norma […] E acompanhou toda essa trajetória da Universidade, a federalização, a mudança das universidades.

Maria Helena seguiu sua trajetória como alguém que abre caminhos em meio de matas fechadas. Com seu olhar sempre desconfiado e muita vitalidade, desbravava caminhos, abria trilhas pelas quais caminhou a arte capixaba.

Obrigado pela sua dedicação. Que Deus lhe dê conforto e que o Grilo te receba de braços abertos para matarem a saudade, a qual agora deixa com a gente.

Siga nessa nova jornada com a certeza de que seus amigos sofrem com sua perda, mas seguem agradecidos por ter feito parte de nossas vidas!
UMA VOZ SILENCIADA: mas “obrigado por todo o bem”

José Cirillo
José Cirillo
José Cirillo é doutor em Comunicação e Semiótica (PUC-SP), mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES,) onde é professor titular e coordenador do Programa de Pós-graduação em Artes. Pós-doutor em Artes pela Universidade de Lisboa. Foi Pró-reitor de Extensão da UFES (2008-2014); Diretor do Centro de Artes (2005-2008). Atua como coordenador do Laboratório de Extensão e Pesquisa em Artes (LEENA), desenvolvendo pesquisas sobre a arte e a cultura capixaba.

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