
Sigo esta semana com o que, provavelmente, será meu último artigo sobre gravura no ES. Não por falta de conteúdo, mas exatamente pela imensidão do tema na produção artística local.
Iniciei essa nossa conversa sobre essa linguagem, muitas vezes pouco observada na arte contemporânea, com o Grupo Varal de Gravura; segui pelos professores da base da Escola de Artes da UFES, até chegar aos dois professores atuais de gravura. Segui, na semana passada por um grupo de jovens estudantes que formavam o Grupo CÉLULA de Gravura. E hoje, termino nossa jornada com uma veterana do Grupo Varal que segue ainda hoje como artista que tem como linguagem Principal a gravura.
No geral, no Espírito Santo foram poucas as experiências com gravuras em formatos fora do convencional. Exceto pelo projeto poético de Mariana Reis, foram poucas as experiências que ultrapassaram os limites tradicionais da gravura no estado.

Mariana Reis, integrante do CÉLULA de Gravura, associa sua formação em artes com sua graduação em veterinária. Mediando intersecções entres essas áreas, Mariana segue com a idealização de possíveis animais pré-históricos, dos quais ela faz uma espécie de catalogação de fósseis.

Mas, minha matéria hoje se dedica a outra artista, Virginia Collistet. Natural do rio de Janeiro, a décadas integra a cena artística capixaba – eu mesmo a conheci nos anos de 1990 como aluna do Centro de Artes. Virgínia é graduada em Artes Plásticas pela UFES, com complementação em Educação Artística (atual Artes Visuais). Atua em exposições desde 1994, com mostras individuais e coletivas no ES, no Brasil e na Alemanha, França e Estados Unidos da América. Foi professora na Universidade de Vila Velha e no município de Serra (Ensino Fundamental e Médio).

Virginia tomou Vitória como sua terra. E em uma série de trabalhos, decidiu homenagear a cidade:
Virgínia Collistet: “A série ” Contornos de Vitória” surgiu para homenagear o Estado que me acolheu com carinho. Eu nasci em Resende-RJ e resido aqui há muitos anos. Um fragmento de esgrafito secular descoberto durante a restauração do Palácio Anchieta, sede do Governo do Espírito Santo , serviu de inspiração para desenvolver 5 Gravuras em linóleo, todas no tamanho A4, de tiragem única, para compor a Série “Contornos de Vitória “, 2024.

Segundo a artista, essa série (de tiragem única) se apresenta a partir da sobreposição de uma única placa, reforçando a descontinuidade das linhas, formas e cores para criar uma dinâmica visual própria no desenho.
Outra série impressionante da artista é a recente homenagem que ela faz à sua mãe. Eu sei o que é esse sentimento de perda, pois como vocês sabem, eu perdi a minha em janeiro passado. Após um ano e meio da morte de sua mãe, Virgínia retoma as suas memórias e decide homenagear a mãe por meio de suas gravuras. A escala de seu trabalho retoma o lugar do intimismo das pequenas formas, compatíveis com os delicados trabalhos de sua mãe.

Segundo Virgínia, “É do ano de 2023/2024 , trabalhos que desenvolvi utilizando como matriz uma massa de modelar tipo clay que me possibilitou retratar os trabalhos em crochê da minha falecida mãe. Eu a perdi tem um ano e meio e tento lidar com esta perda fazendo uma homenagem a ela, através do meu trabalho de Gravura. São gravuras únicas.”
A artista inova mais uma vez, ao utilizar material maleável e moldável (massa de modelar) como matriz da gravura. O resultado impressiona pela aparência e transparecia da forma. A artista associa o seu domínio técnico com a sutileza de sua lembrança para transformar vida e dor em arte.

Virgínia Collistet é um dos membros do grupo Varal que segue com uma produção atual de gravura. O que revela que a UFES, por meio de uma açõa idealizada pela artista e professora Gracinha Rangel estava certa: temos uma forte tradição para a gravura.
Precisamos de visibilidade para além dos modismos da arte. O Varal, a partir de seus membros está atravessando décadas de trabalho e de dedicação a uma arte milenar.

O Grupo Varal é hoje mais que uma fotografia esmaecendo com o tempo. Ele segue vivo com o trabalho, mesmo disperso, de um coletivo de artistas que renovou a gravura capixaba. Vivemos os desdobramentos dessa ação e seguimos gravando memórias e processos na arte capixaba.
Encerro esse texto com o final da conversa com Virgínia, quando perguntei sobre o mercado de arte e o que a move para continuar produzindo. Sua resposta foi pronta: Eu não tenho Galeria e vendo pouco os meus trabalhos. Eu faço gravura por pura paixão e já não sou dona do meu querer. Apenas faço por necessidade . .. urgência (risos). A vida fica menos miserável.
A arte segue temperando a vida!!!
Revisão: Giuliano de Miranda