Esta semana apresento a vocês uma terceira visão dos aspectos da gravura capixaba. Gravura, numa escola de Artes, compreende os fazeres em que o resultado do trabalho se dá por meio da impressão (quase sempre artesanal) a partir de uma matriz, na qual o desenho ou imagem é feita espelhada; o processo de entintamento dessa matriz e de sua impressão em papel ou outro suporte, resulta em a imagem. O principal diferencial desse procedimento nas artes é que ele, por ter uma matriz da imagem, nos permitem fazer o que chamamos de tiragem, processo que resulta em um conjunto de cópias, sempre numeradas, sendo todas entendidas como originais.
O que chamamos de gravura compreende a xilogravura e a gravura em metal (as mais tradicionais), além da litogravura, da monotipia, calcogravura, a serigrafia e muitas outras formas de gerar uma imagem a partir de uma matriz. Segundo Fernando Gómez, a gravura resultante é
[…] é considerada uma criação total do artista, muitas vezes em
colaboração com um editor, e também com um impressor ou oficina
especializada. A referida obra original sempre deverá estar assinada e
numerada, e a autenticidade da assinatura e da veracidade da numeração
são responsabilidade tanto do próprio artista quanto do editor ou do
impressor da mesma, cabendo ao vendedor da obra
comprovar a autenticidade e garantir toda a documentação pertinente.
A gravura como expressão humana acompanha a humanidade, temos referências de livros ilustrados com gravuras em 1498, com xilogravuras que ilustram o Apocalipse; mas podemos considerar que a gravura alcançou grande destaque com a invenção da imprensa, pois era um modo funcional de “ilustrar” as publicações. Com o advento de formas mais inclusivas de produção de livros, as gravuras, em especial a em metal, se tornou um forte aliado na difusão do conhecimento, aliando texto verbal e as imagens.
Para Fabrício Fernandes e Samara Cordeiro, a xilogravura é a mais antiga forma de gravura.
A técnica mais antiga para a produção de gravuras é conhecida como
xilogravura. Sua invenção está relacionada a um método de impressão
sobre tecido praticado na China, no Egito e no Império Bizantino. Antes, em
1300, a técnica chegou à Europa por meio dos impérios Bizantino e Islâmico.
Ao Ocidente, vindo da China, o papel chegou pela Espanha Islâmica e no
final do século XIII já era fabricado na Itália. Na Alemanha, há registros
que sua produção teve início no final do século XIV.
No final do século XV, ilustrações para livros chamadas iluminuras e cartas
de baralho começaram a empregar a xilogravura em
sua confecção. Em 1658, o educador tcheco, Comenius (1592-1670), pai da ilustração em material didático, publicou o primeiro livro com gravuras sugerindo a
prática (ouvir, (re)ler, copiar, imitar, falar, escrever) enriquecida
por regras e a regra induzida por leitura (cf. CHAGAS, 1979).
Já, a gravura em metal é posterior, dados revelam que ela surgiu no século XV, aproximadamente, na Europa. Nesse processo, as placas, ou matrizes, pode ser feitas em “ […] a partir de placas de cobre, zinco, latão e alumínio. As gravações nas matrizes, ou placas de metal, são feitas por incisão direta – ponta seca – ou pelo uso de banhos de ácido – água-forte e água-tinta. Diferentemente da xilogravura em que a tinta é colocada no relevo da madeira, na gravura em metal essa se deposita nos sulcos da chapa.


A história da gravura no Espírito Santo é recente e está ligada à criação do Centro de Artes da UFES. A primeira turma de gravura foi introduzida junto com o início das atividades do professor e artista Raphael Samu (1929-2022). Ele formou as primeiras gerações de gravurista na escola. Desse grupo, surge Maria das Graças Rangel, que me atrevo a chamar de Dama da Gravura, pelo seu papel na efetivação dessa linguagem no estado, bem como por levar a nossa gravura para além das fronteiras brasileiras.
Gracinha Rangel, Maria das Graças Coelho Rangel (1947) é natural de Vitória. Formada em Artes Pela UFES, foi professora adjunta no Centro de Artes (1978-1998), onde ministrou gravura e desenho. Foi coordenadora de Curso, de projetos de extensão e atuou em instâncias superiores na UFES (CEPE). Como gravurista e professora, organizou o Grupo Varal de Gravuras (tema da minha primeira coluna sobre gravura aqui com vocês). Como artista, participou de inúmeras mostras nacionais e internacionais que deram visibilidade ao processo criativo da gravura em terras capixabas, com importante parcerias nacionais e estrangeiras.

Gracinha – como era afetuosamente chamada enquanto professora, criou o Ateliê Livre de Gravura em 1983, de onde nasceu o Grupo Varal de Gravura, em maio de 1993. Participou com esse Grupo, de Exposições, Palestras e Oficinas de Gravura no Espírito Santo, em Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, e no exterior – West Virgínia, Montova, Colonia, Berlim, Rosario, de 1993 a 2000. A exposição de criação do grupo foi em que teve sua primeira exposição em 1993, com a participação dos profissionais desenhistas e gravadores da Casa da Moeda do Brasil, na Galeria de Arte do Yazigi Internacional.


“[…] em um dia comum eu estava em aula, quando Samú entrou em sala com alguém
que eu não conhecia. Ele me apresentou como seu professor. Era Mário Gruber.
Estávamos com quatro gerações de gravadores em sala: Mário Gruber, Samú, eu e os
meus alunos. Foi muito bom. Ele participou da aula, dando dicas de
gravação e de impressão. Inesquecível!”
Nesse depoimento vemos a generosidade dessa dama da gravura que entende seus alunos como uma nova geração da gravura. Exatamente eles dão continuidade a esse processo na UFES e no Espírito Santo.
Revisão: Giuliano de Miranda
Uau, Professor Cirillo! Quando passei pelo rico laboratório de gravura do CAR, fui iluminada por alunos veteranos e professores que pareciam distribuir um sentimento comum entre eles próprios, o amor pela gravura. Saí desse período, com a consciência do poder e a relevância da gravura, na comunicação entre os povos. Por sua reprodutibilidade, nos fazem compreender que as impressões, tornam-se um veículo de longo alcance e puderam e podem chegar a mais gentes, com mensagens gravadas sobre tudo; e com isso, poder abordar qualquer pensamento. Pensamentos filosóficos, românticos, questionamento aos acontecimentos políticos, sociais e de direitos adquiridos, de forma íntima. Enfim, parabéns por mais um maravilhoso texto, que nos alumbra de forma crescente, sobre as bases de nosso amado e passional Centro de Artes da UFES. Saber mais uma parte dessa base, como a Professora Rangel, foi um prazer por todos os vieses que tomarmos para nos orientar.
Muito obrigada, por mais esse alumbramento!
Viva Gracinha Rangel!
Forte abraço de Pomarelhos,
Sua Amiga,
Claudia Colares