Por muito tempo, o compliance foi visto como um conjunto de regras, controles e punições. Um sistema de vigilância interna voltado a evitar multas, escândalos e crises reputacionais. Esse modelo, de caráter essencialmente legalista e punitivista, ainda cumpre um papel importante, mas já não é suficiente. O compliance moderno é, acima de tudo, um compromisso com valores humanos e organizacionais. Ele não se sustenta na coerção, mas na consciência ética das pessoas.
Essa mudança de perspectiva revela que não existe “meia integridade”. Ou se age com ética e responsabilidade, ou se falha com a cultura da empresa. A coerência entre discurso e prática tornou-se o principal indicador de credibilidade institucional. Hoje, o colaborador é avaliado não apenas por seus resultados, mas também por como os alcança. O respeito, a empatia, a transparência e o senso de justiça passaram a ser ativos intangíveis que compõem o capital reputacional da organização.
Nesse contexto, o dever de manter conduta ética não se encerra no crachá. Em tempos de redes sociais e exposição permanente, a fronteira entre o “dentro” e o “fora” da empresa se diluiu. A reputação corporativa é diretamente afetada pela postura individual de seus integrantes, o que reforça a necessidade de coerência entre valores pessoais e institucionais.
Casos recentes demonstram isso com clareza. Empresas globais e nacionais têm demitido funcionários por manifestações públicas que extrapolam a liberdade de expressão e incitam o crime ou a violência, evidenciando que o comportamento fora do ambiente de trabalho também comunica — e compromete — a imagem corporativa.
Um exemplo emblemático foi o desligamento de colaboradores que exaltaram, em redes sociais, o assassinato de Charlie Kirk, ativista conservador norte-americano. Ainda que as opiniões políticas sejam de foro íntimo, a apologia à violência é incompatível com qualquer código de conduta sério. As empresas, pressionadas por consumidores, investidores e parceiros, não podem mais se omitir diante de condutas que atentem contra os valores que pregam.
Diante desse novo cenário, o compliance não é tarefa exclusiva do departamento jurídico. É missão das lideranças traduzir os princípios éticos em comportamentos diários, reconhecendo atitudes corretas e corrigindo desvios de forma construtiva. Treinamentos, diálogos e exemplos reais substituem o medo de sanção por uma cultura de pertencimento e propósito. Quando o colaborador entende que integridade não é um dever imposto, mas uma escolha que fortalece a todos, o compliance deixa de ser burocracia e passa a ser identidade organizacional.
Assim, o futuro do compliance não pertence às planilhas nem aos códigos formais — pertence às pessoas. Empresas éticas são feitas por indivíduos éticos. E indivíduos éticos não o são apenas quando convém ou quando alguém observa, mas em tempo integral. A integridade é, portanto, o maior ativo de uma organização — e o único que não pode ser terceirizado.
Rodolpho Pandolfi Damico
Advogado
Especialista em Compliance pela American University Washington College of Law
LLM em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas











