O presidente Jair Bolsonaro, em sua visita ao Espírito Santo na última sexta-feira, 11, manteve-se fiel à sua personalidade política: despertou amor e ódio por onde passou. Ainda no aeroporto de Vitória, uma legião de fãs (sim, Bolsonaro tem fãs, do inglês “fan”, uma redução para “fanatics” ou “fanáticos”, em bom português) o aguardavam. Em São Mateus, cidade destino no extremo norte, outro mar de gente o esperava (parte com máscara, parte sem; acessório totalmente dispensado pelo presidente ao pisar em solo capixaba).
Entretanto, outros minutos em solo, no aeroporto de Vitória, já anunciavam que a visita presidencial não seria recheada só de abraços calorosos; haveria, também, as vaias, no curto caminho entre o avião da FAB e o da Azul, aeronave que, descumprindo todas as normas de segurança, abriu as portas para que o presidente, que não era passageiro daquele voo, cumprimentasse seus ocupantes – incluindo o piloto, afoito e sem máscara –, que em parte o receberam com gritos de “mito” e, em parte, com a alcunha de “genocida”.
O presidente também não despertou amor algum – pra não dizer que alimentara o ódio – nos ocupantes do Palácio Anchieta, sede do governo estadual, que tiveram sua presença dispensada na agenda. O encontro era dos fãs de Bolsonaro e a direita do Espírito Santo. A esquerda estava, solenemente, desconvidada. E, mesmo apesar dos constantes confrontos com o governo federal, soltou um “surreal” para comentar, extraoficialmente, o desconvite. Surreal, esse comentário.
Todo esse estratagema só ilumina ainda mais um palco com atores que se posicionam em suas extremidades. Aos que tentam avançar sobre o centro, são lançados de volta ao extremo, na tentativa de silenciar sua caminhada.
O Brasil virou uma grande disputa de polos. O meio simplesmente inexiste. E esse cenário é replicado no resto do país, inclusive em Estados pouco expressivos do ponto de vista eleitoral, como é o caso do Espírito Santo. Essa briga fratricida a um ano meio da eleição só expõe como será o pleito do ano que vem: uma disputa que verterá ódio e sangue sem direito a suturas para reduzir a pressão do jorro. Vencerá aquele que conseguir debelar de forma mais cirúrgica sua hemorragia.
Mestre da arte da guerra, o chinês Sun-Tzu pregava que se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas; se você se conhece mas não conhece o inimigo, para cada vitória ganha sofrerá também uma derrota. Mas, se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas.
O grande problema do Brasil de hoje é essa falta de identidade política. Um presidente da República sem partido e um governador que critica o dono da festa, mas quer ser convidado por ele, são a sombra desse Megazord: um robô troncho da série Power Rangers, formado por peças desconexas e que era utilizado como arma de destruição suprema em um campo de batalha. Tudo a ver.
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Fernando Carreiro, 36, é jornalista e consultor de comunicação especializado em imagem, reputação e gerenciamento de crises.