O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES), por meio da Promotoria de Justiça de Guarapari, ajuizou uma Ação Civil Pública contra as empresas Grand 059 Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. e MMP&Tres Participações S.A., além do Município de Guarapari, em razão de supostas irregularidades na alienação e posterior valorização do terreno onde está sendo implantado o empreendimento “Salt by Grand”, na Enseada Azul. Segundo o MPES, as práticas identificadas geraram um prejuízo estimado em R$ 60 milhões ao município.
A ação pede a anulação da venda do imóvel público, a declaração de inconstitucionalidade da alteração de zoneamento que permitiu a execução do projeto e a nulidade das licenças e atos administrativos vinculados ao empreendimento. O órgão requer ainda a reintegração do patrimônio público e o reconhecimento de irregularidades urbanísticas e ambientais que teriam marcado todo o processo.
A Promotoria ressalta que a divulgação do caso tem caráter preventivo, com o objetivo de alertar consumidores que já adquiriram ou pretendem adquirir unidades sobre possíveis riscos associados à regularidade jurídica do empreendimento.
Valorização atípica do imóvel
De acordo com a ação, o terreno de 7.135 m², localizado na Enseada Azul, foi vendido em 2022 por R$ 10 milhões, em uma concorrência que contou com apenas um participante. Pouco tempo depois, porém, o mesmo terreno passou a ser avaliado em cerca de R$ 70 milhões, alta superior a 700%. Para o MPES, essa valorização estaria diretamente ligada à mudança legislativa que ampliou o potencial construtivo da área.
O Ministério Público afirma que a dinâmica permitiu que ganhos econômicos expressivos fossem apropriados por particulares, quando deveriam ter sido revertidos ao município, resultando no prejuízo estimado de R$ 60 milhões.
Alteração de zoneamento sob suspeita
A mudança de zoneamento foi aprovada pela Lei Complementar Municipal nº 150/2023, que, segundo a ação, tramitou sem estudos técnicos, sem participação popular e foi incluída na pauta no mesmo dia da votação. Para a Promotoria, esse procedimento indica uma aprovação “atípica”, direcionada a atender interesses específicos.
Depoimentos colhidos no curso da investigação apontam divergências sobre a autoria e origem da proposta de alteração, reforçando dúvidas quanto à legitimidade do processo legislativo.
Prejuízo ao patrimônio público
O MPES sustenta que os fatos não representam apenas irregularidades isoladas, mas uma sequência de atos coordenados que teriam favorecido agentes privados. Entre os elementos citados estão:
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a alienação do terreno por valor inferior ao potencial econômico;
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a rápida alteração normativa que ampliou a capacidade construtiva;
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a celebração de contratos prevendo ganhos elevados, com VGV estimado em R$ 351 milhões.
Impactos urbanísticos e ambientais
Antes da mudança legislativa, a área era classificada como zona de baixa densidade e incluía um trecho de proteção ambiental. A nova classificação permitiu verticalização intensa, aumento significativo da altura máxima permitida e supressão de limitações ambientais, tudo sem estudos técnicos ou consulta pública. O próprio veto do então prefeito — posteriormente derrubado — reconhecia parte desses problemas.
Medidas solicitadas
O Ministério Público pede à Justiça:
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a declaração de inconstitucionalidade da mudança de zoneamento;
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a anulação da licitação e da venda do terreno público;
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a nulidade das licenças e aprovações relacionadas ao empreendimento;
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o reconhecimento do prejuízo de R$ 60 milhões ao município;
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a responsabilização dos envolvidos;
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a reintegração do terreno ao patrimônio público;
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a concessão de tutela de urgência para suspender atos e efeitos do empreendimento até o julgamento final.
Alerta ao consumidor
Ao tornar a ação pública, o MPES sinaliza a necessidade de cautela por parte de consumidores de boa-fé. Segundo a Promotoria, eventuais decisões judiciais podem resultar em revisões de licenças, alterações no potencial construtivo ou paralisações das obras, afetando quem já adquiriu ou pretende adquirir unidades no “Salt by Grand”.
O diz a Grand
A Grand Construtora informou que ainda não foi notificada oficialmente sobre a Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público do Espírito Santo, mas esclareceu que não participou da compra do terreno mencionado e não possui sociedade com a empresa MMP3. Segundo a empresa, o empreendimento está sendo desenvolvido por meio de um contrato de incorporação firmado após a aquisição do imóvel pela MMP3, então proprietária da área, sem qualquer restrição.
A construtora afirma que atua sozinha no projeto, sendo responsável pela obra e pelo pagamento ao antigo proprietário com futuras unidades. Também destaca que o empreendimento foi concebido e está sendo executado conforme a legislação vigente à época da assinatura e do licenciamento. Por fim, afirma que todas essas informações foram repassadas ao promotor do caso e que causa estranheza qualquer tentativa de associá-la à negociação do imóvel entre a MMP3 e o Município de Guarapari.











