Dólar Em baixa
5,148
25 de abril de 2024
quinta-feira, 25 de abril de 2024

Vitória
23ºC

Dólar Em baixa
5,148

Um elefante incomoda muita gente

Dia desses li uma estatística segundo a qual, dos jornalistas vítimas de homicídio, 29% trabalhavam investigando casos de corrupção e 48% em editorias de política – contra, surpreendentemente, apenas 24% que cobriam guerras!
Aliás, se somarmos os profissionais encarregados da cobertura das áreas de negócios e direitos humanos que foram assassinados, chegaremos a 21% – só um pouco a menos dos que morreram em violentos campos de batalha! Realço que não estamos a falar de exceções – só em 2010 a cada três dias morreu algum profissional da imprensa a trabalho.
Cheguei a uma conclusão óbvia: é mais seguro para um jornalista estar no meio de uma guerra, ao som de tiros e bombas, do que escrevendo alguma matéria sobre, por exemplo, corrupção.
Minha convicção é reforçada pelo fato de que, quanto aos casos de homicídio intencional (excluídas, pois, mortes acidentais em conflitos armados), o índice de impunidade chega a 88% – o que só é possível sob a omissão clara e cúmplice do aparelho estatal. Tradução: 88% dos assassinos de jornalistas estão soltos, celebrando alegremente o temor que seus exemplos infundem aos que ainda vivos estão.
Decidi fazer uma varredura em meu “banco de dados”, buscando mais reportagens sobre a quantas anda a imprensa livre. Transcrevo, abaixo, algumas frases que encontrei publicadas pelo planeta afora.
Começo pela Austrália: “O Governo Federal enviou ao Parlamento proposta de legislação que inclui maior supervisão da imprensa escrita e eletrônica”. Prossigo para a Europa: “Em uma ação que deveria horrorizar  qualquer um que acredite na democracia, descobriu-se que a Comissão Europeia está injetando milhões de Euros em grupos dedicados a restringir a liberdade de imprensa”.
Não discrepa a Romênia: “O Senado aprovou uma emenda para a lei de transmissão, obrigando emissoras de televisão e rádio a  possuírem notícias positivas em pelo menos 50% de sua programação”. Segue-lhe a não tão distante Hungria: “Um órgão público de divulgação húngaro interrompeu sua programação em protesto contra uma nova e controversa legislação de controle da imprensa”.
Na Etiópia, noticiava-se que uma nova legislação “cria um conselho gerenciado pelo Estado para supervisionar a imprensa”. Nos EUA: “repórteres temem possíveis indiciamentos criminais por conta de informações que receberam” – a tão conhecida “censura judicial”. Do outro lado do oceano, no Reino Unido, não é menos sinistro o aviso: “Jornalistas podem ser processados por divulgarem o que é dito no Parlamento, segundo advertiu o Procurador-Geral”.
Aqui perto, no Equador, “foi aprovada a Lei de Comunicação, um projeto polêmico que cria organismos de controle da imprensa e impõe sanções a jornalistas e publicações”.
Notem que fugi a casos pessoais – apenas me ative ao genérico, à tendência indiscriminada. Se tivesse descido aos casos pessoais, necessitaria não de uma coluna, mas talvez de um livro para descrever o que encontrei.
Disto tudo resulta que apenas uma a cada sete pessoas no planeta tem acesso ao que poderíamos chamar de “imprensa livre”. Chamou-me a atenção uma declaração da pesquisadora que chegou a esta conclusão, Karin Karlekar: “as tendências gerais são decididamente negativas”.
Há algumas décadas Albert Camus, sensatamente, nos advertiu de que “a liberdade de imprensa é talvez a liberdade que mais tem sofrido pela degradação da ideia de liberdade”. Fico a meditar se, contemplando as cenas pavorosas de tantos miseráveis sofrendo por conta da pura ganância de tão poucos, e escutando os gemidos dos que sofrem, na imprensa ou fora dela, por simplesmente terem dito a verdade, deveríamos recordar, com Hemingway, que os sinos dobram por nós.
Pedro Valls Feu Rosa
Pedro Valls Feu Rosa
Desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo desde 1994. Programador de computadores, autor de diversos “softwares” dedicados à área jurídica, cedidos gratuitamente a diversos Tribunais do Brasil. Articulista de diversos jornais com artigos publicados também em outros países, como Suíça, Rússia e Angola.

Você por dentro

Receba nossas últimas notícias em primeira mão.

Escolha onde deseja receber nossas notícias em primeira mão e fique por dentro de tudo que está acontecendo!

Comentários

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Mais Lidas

Notícias Relacionadas