Reverter a degradação que a natureza vem sofrendo no decorrer dos anos com o progresso desenfreado é uma tarefa muito difícil, que demanda tempo e dedicação, e que demorou muito para se tornar pauta do poder público. No Espírito Santo, o Programa Produtor de Água, da Agência Nacional das Águas (ANA), que tem como objetivo a redução da erosão e assoreamento dos mananciais nas áreas rurais, algo extremamente urgente, ainda está em fase de implantação. Já o programa Reflorestar, do Governo do Estado, que inicialmente tinha o objetivo de recuperar 80 mil hectares de Mata Atlântica no Espírito Santo até 2018, redefiniu o prazo para 2020, para se chegar a este objetivo.
Mesmo assim, alguns dos produtores rurais que fazem parte do Reflorestar estão indo além das expectativas. É o caso do senhor Elias Cassimiro e de sua esposa Edna Moreira, que já implementaram em sua propriedade em São Roque do Canaã, na região capixaba dos imigrantes , ações sustentáveis voltadas para a conservação da vegetação nativa e recuperação da cobertura florestal, promovendo também a restauração do ciclo da água. Este é o terceiro ano que eles participam do Reflorestar.
“Nossa primeira ação foi manter as árvores nativas que tínhamos em pé, APP (Áreas de Preservação Permanente) e agora plantamos mudas de árvores, mantendo corredor passivo, e recuperando outras áreas dentro da propriedade. Nossa área de preservação era de 4.9 hectares e isso aumentou com as áreas que deixamos de roçar. No rio já não desce mais aquela área suja que descia e tudo isso vai favorecer ao rio em longo prazo”, contou o senhor Elias.
Ele afirma que já plantou mais de mil árvores em sua propriedade e também tem trabalhado na recuperação das nascentes dentro de seus domínios. “Quando você vê uma árvore que plantou, crescendo e saindo é muito gratificante. No futuro, os filhos e netos vão falar dos antepassados que plantaram e a propriedade ficou muito mais bonita. Onde tinha nascente, paramos de mexer, e está fechando tudo de árvore em volta”, diz o produtor, exclamando o prazer de trabalhar na roça.
Regeneração
Ercílio Braun, 51, também participa do Reflorestar desde o ano de 2015. Em sua propriedade, no município de Colatina, ele já cercou 11 hectares de matas para regeneração, cercou as nascentes e está fazendo Sistema Agroflorestal (SAF), plantando árvores nativas e também frutíferas para proteger os córregos e, de quebra, ter produção de frutas para o sustento da família. “Tem o SAF, mas também tem renda com o plantio de cacau, coco, banana, palmito, açaí, pupunha”, explica o agricultor.
E os resultados de toda a preservação são visíveis. “Principalmente na área de regeneração, que é alta e íngreme, não vemos mais enxurrada. Porque antes descia muita água, terra e enterrava a nascente. Agora praticamente não desce mais água, e a que desce é limpa. A água vai infiltrando e fortalecendo as nascentes. Vemos que isso já está acontecendo e é muito positivo”, disse o produtor, que é pago pelas três modalidades que participa no programa: a preservação de 42 hectares de mata, “mata em pé”; a área de regeneração de 11 hectares e o SAF.
Alunos aprendem com os produtores
Ercílio não só preserva. Ele vai mais longe. Além de não esconder a satisfação de contribuir com o planeta, ele ainda passa o conhecimento e as práticas que realiza adiante. Ele abre sua propriedade para que as escola públicas tragam seus alunos para visitas e estágios de preservação e conscientização.
“Temos recebido alunos das escolas do campo que fazem intervenções junto à natureza. Falamos e mostramos a importância de se conservar, e eles conhecem as ações, aprendem na prática. É o retorno mínimo que podemos dar para contribuir. Não queremos ser fechados, fazer dessa experiência só minha, mas que ela possa atingir muitas outras pessoas e produtores, fazendo esse trabalho de conscientização”, alegra-se o agricultor.
E expressa sua satisfação: “Temos que ter esse carinho com a terra. O programa veio reforçar esse sonho de ter o trabalho de uma agricultura sustentável, sem agredir, nem poluir. É um reforço que estávamos precisando para continuar, implementar, crescer, e desenvolver essas atividades com renda. Estamos muito satisfeitos e acabamos sendo referência e modelo para outras pessoas, para que tenham um olhar diferente sobre a forma de se trabalhar na propriedade. O sentimento é de satisfação e gratidão em poder contribuir um pouco para melhorar situação do planeta”.
8.300 hectares recuperados em 2018
Os produtores recebem um pagamento anual do programa Reflorestar (PSA – Pagamento por Serviço Ambiental) para as ações de plantio e preservação . “É uma parceria e temos contrapartida de plantar e preservar. É o pagamento anual que recebo é de R$ 4.200,00. É muito bom para nós e com certeza queremos continuar no projeto e incentivar as pessoas que tiverem interesse para fazer também o que é importante”, afirmou Elias Cassimiro. Já Ercílio Braun recebeu em 2018 cerca de R$ 12 mil para realizar as três modalidades descritas.
De acordo com o secretário de Meio Ambiente, Aladim Cerqueira, até o fim de 2018 serão contratados 8.300 hectares de recuperação de florestas em propriedades rurais. Um segundo viés do programa é monitoramento e recuperação da Mata Atlântica por meio de mapeamento. “De 2008 a 2015 tivemos 27 mil hectares de crescimento. E temos mais 28 mil hectares em estágio inicial de regeneração. Isso significa que temos um indicativo forte de que cumpriremos as metas”, disse o secretário, e exaltou o trabalho dos produtores.
“Faz parte do programa Reflorestar a parte de iniciativa dos próprios produtores em área de lavoura ou pastagens abandonadas. Quem efetivamente está fazendo crescer é o produtor, abandonando a área. E o pagamento financia essa mudança do sistema, para que floresta entre na lógica da produtividade”, explicou.