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Ozon faz denúncia e perturba Berlim

Após o fraco filme de abertura – The Kindness of Strangers, de Lone Scherfig -, a seleção do 69.º Festival de Berlim não cessa de melhorar. Dieter Kosslick, que assina sua seleção de despedida como diretor do evento, pode ter pisado em falso, mas já retomou o prumo. Ondog, de Wang Quanan; System Crasher, de Nora Fingscheidt; e o melhor de todos, o surpreendente By The Grace of God, Grâce à Dieu, de François Ozon. Um dos cineastas mais prolíficos do mundo, Ozon tem conseguido manter o ritmo de um filme por ano, com os quais frequenta os maiores festivais. Cannes, Veneza, Berlim… Nas suas sucessivas entrevistas para o Estado, ele afirma que faz cada filme contra o anterior, movido sempre pelo desejo de se testar e mudar tudo, história, estilo, temas.

Após o thriller erótico/psicanalítico O Amante Duplo, que, de certas forma, foi o seu (David) Cronenberg – as mutilações que transformam homens e mulheres em aberrações aos olhos de seus semelhantes -, Ozon fez agora o seu Francesco Rosi. O tipo de cinema documentado do mestre italiano de O Caso Mattei não é o que se espera dele, mas Ozon sai-se muito bem. O filme inspira-se numa história real – o processo que três homens movem contra um padre de Lyon, por abuso sexual. De repente, o que está em debate é algo muito maior – a Nunciatura de Lyon, a Igreja Católica -, porque as vítimas são muito mais numerosas e o acusado nunca negou, nem para seus superiores, seus problemas com crianças. Discute-se a etimologia – pedófilo ou pedossexual?

Acostumado a tratar com ficção, Ozon dessa vez opera no registro do docudrama e logra, com a cumplicidade de seu elenco – à frente o ator Melvil Poupaud -, realizar um acurado estudo de personagens, analisando os efeitos devastadores do abuso na vida desses homens (e seus familiares). Talvez, com seus 137 min., o filme seja um pouco longo, mas é forte e perturbador, sobre um assunto da maior relevância (e permanente atualidade). Comparativamente, Ondog, que se passa nas amplas e horizontais paragens da Mongólia, parece um óvni. Um mundo plano. De um lado e outro, imensidão a perder de vista. No meio do nada, um corpo de mulher. Nua, assassinada.

A polícia inicia uma enquete, que começa por deixar um jovem guarda – de 18 anos – naquele fim de mundo, para vigiar o corpo. Ele é virgem. Surge essa mulher montada num camelo, com quem o garoto aprende a fumar, faz sexo. Ela engravida – ondog, em mongol, quer dizer ovo/óvulo. O que o corpo da mulher morta e a gravidez inesperada têm a ver com o ovo de dinossauro que os norte-americanos encontraram nas estepes da Mongólia? Nada, tudo, tal é a complexidade do novo longa de Quanan, que já recebeu os Ursos de Ouro e Prata, e está fazendo bela figura na seleção de 2019.

Mesmo o fim do mundo está se transformando – moto, celular -, mas o tempo segue seu ritmo. Matar a ovelha, ajudar no nascimento do novilho. E dançar – Love me tender, love me true, o romantismo de Elvis. O rock é mais pesado – punk, em System Crasher.
O termo informal designa essa garota de 9 anos que confronta o sistema. Rejeitada pela mãe, que prioriza os dois filhos de outro casamento, Benni, a impressionante Helena Zengel, não é aceita em nenhum lar ou instituição. Benni não deixa que ninguém toque seu rosto e quando isso ocorre ela agride aquele a quem considera agressor. Benni vive em fuga, mas não é a corrida para o mar de Antoine Doinel no clássico de François Truffaut, Os Incompreendidos. Incompreendida ela talvez não seja. O educador é dos que tentam, mas só consegue ajudá-la em parte, porque Benni ameaça comprometer sua estrutura psicológica e familiar. É uma ligação intensa. Sejamos claros – com exceções, os filmes alemães costumam ser os piores da Berlinale. System Crasher, grâce à Dieu, é dessas exceções.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Luiz Carlos Merten, enviado especial
Estadao Conteudo
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