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A bacia de Pilatos

Saudamos, há poucos dias, a aurora de um novo ano! Sempre vem aquela vontade de melhorar algo neste mundo – e com ela algumas armadilhas, nos atraindo à omissão fruto da impressão, falsa, de que pouco podemos fazer para mudar o que aí está.

Pois é. Mas você já parou para pensar, alguma vez, o quanto encontrou de conforto e tecnologia quando a este mundo chegou? Já lhe passou pela mente que você vive mais e melhor por conta do fato de que alguns semelhantes nossos deram um pouco mais de si do que lhes seria exigível?

Vamos começar pela transfusão de sangue, que salva milhões de vidas pelo planeta afora. Você recebeu, gratuitamente, uma técnica que custou a vida do russo Alexander Bogdanov. Este, em 1924, começou a realizar experimentos com transfusão sanguínea – em si mesmo, dada a falta de voluntários. Infelizmente, a ciência das transfusões ainda engatinhava, e este médico acabou morrendo em 1928, por conta de ter recebido sangue infectado com malária e tuberculose.

Pense agora na imprensa, da qual todos nos beneficiamos. Ela existe, tal qual a conhecemos, devido a um inventor norte-americano, William Bullock, criador da gráfica rotatória – que ajudou a revolucionar a indústria da impressão por sua grande velocidade e eficiência. Eis que, em abril de 1867, um pedaço de sua invenção desprendeu-se, esmagando seu pé, causando uma gangrena que resultou em sua morte.

E os infinitos usos da radioatividade no campo da saúde humana, da qual todos, em algum momento da vida, já nos beneficiamos? Tudo começou em 1898, quando Marie Curie e seu marido Pierre descobriram o elemento químico rádio. A partir daí, ela dedicou o restante de sua vida a realizar pesquisas sobre terapias com radiação – até morrer de leucemia, fruto dos efeitos até então desconhecidos da exposição a que se sujeitara.

Falando em saúde, você vai a um hospital e encontra doentes confortavelmente acomodados em camas que se modificam conforme a necessidade dos pacientes. Isto acontece graças ao engenheiro Thomas Midgley Jr., criador de um sistema de cordas e roldanas para que os doentes pudessem ser manuseados com maior conforto nos hospitais. A ironia é que este genial inventor acabou falecendo estrangulado por uma corda solta de sua própria invenção.

E a eletricidade? Você não poderia viver como vive hoje se lá atrás um certo Nikola Tesla não tivesse descoberto o primeiro uso prático da corrente alternada – viabilizando o gerador elétrico de CA, o motor de indução etc. Pobre Tesla: morreu louco e esquecido, sofrendo alucinações visuais e auditivas, chegando a considerar as pombas como suas únicas amigas.

Não nos esqueçamos, ainda neste campo, de Oliver Heaviside, um dos fundadores da teoria moderna de circuitos elétricos e análises de vetores em eletromagnetismo – suas ideias são palpáveis até os dias atuais. Sem este brilhante semelhante nosso, que também morreu louco, não nos seria possível usufruir do conforto que a maioria das engenhocas eletrônicas que nos cercam proporciona.

Será assim, de exemplo em exemplo, que perceberemos o quão pouco contribuímos para o fabuloso mundo no qual vivemos – em contraste com tantos outros que, no mais das vezes sob pungente sacrifício pessoal, quase sempre sem a devida recompensa, plantaram no passado o que hoje colhemos. Sai daí, sem retoques, uma imposição moral: fazer a nossa parte, não importa o quão pequena ela seja, aprimorando o belo legado que recebemos.

Que ao longo de 2018 a cegueira de alguns, insensíveis ao fato de que as coisas da vida passam, e passam muito depressa, não nos afaste deste sagrado dever de grandeza, pois que, no conselho sábio de Disraeli, nossa existência é curta demais para ser pequena!

Pedro Valls Feu Rosa
Pedro Valls Feu Rosa
Desembargador do Tribunal de Justiça do Espírito Santo desde 1994. Programador de computadores, autor de diversos “softwares” dedicados à área jurídica, cedidos gratuitamente a diversos Tribunais do Brasil. Articulista de diversos jornais com artigos publicados também em outros países, como Suíça, Rússia e Angola.

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Comentários
  1. Pena que a maioria das pessoas tenha o ponto remoto de visão muito próximo, não permitindo que enxerguem nitidamente além de seus narizes… Poucos tem o ponto remoto no infinito.

    Parabéns pelo seu texto, muito apropriado para o momento que vivemos.

    O conhecimento da história da ciência nos abre os olhos para a verdadeira dimensão de nossa existência e da importância de nossa evolução.

    De seu ex-professor, Elder.

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